Pesquisas
Museu Virtual Professora Noêmia Lourenço da Silva:Da proposta à materialização
Yan Roberto Santos de Oliveira
O Museu Virtual Professora Noêmia Lourenço da Silva se localiza na rota histórica que conecta os municípios de Condeúba, Cordeiros e Vitória da Conquista, entre Alto Sertão e Sertão da Ressaca. Este trajeto do museu é marcado pelas relações de mobilidade dos sujeitos históricos que, ao longo do processo emancipatório até a contemporaneidade, transitaram e ainda percorrem por essas localidades.
Criado em meio à pandemia de COVID-19, em 2020, o Museu vai além da memória da educadora Noêmia Lourenço da Silva, buscando preservar, conservar e disseminar a história, a memória, os saberes orais, e os documentos escritos e iconográficos que estão intrinsecamente ligados à rota histórica, refletindo as vivências coletivas desses territórios.

Figura 1 – Ilustração da rota história de Condeúba/Cordeiros/Vitória da Conquista.
Arte gráfica feita por Yan Roberto, 2024
No campo da Nova Museologia e da Tecnologia Social, um museu virtual é uma plataforma que preserva, salvaguarda, exibe e dissemina coleções culturais e históricas por diferentes territórios através da tecnologia. A Museologia Social trouxe uma nova perspectiva ao expandir os horizontes dos museus e acervos, permitindo que eles transcendam seus muros físicos.
A revolução digital não só ampliou o acesso às coleções e acervos, tornando-os disponíveis para um público mais amplo, como também promoveu uma reflexão sobre o Fato Museal e seu desenvolvimento no contexto do Marco Museal estabelecido durante a pandemia. Esse novo olhar para a virtualidade permitiu aos museus explorar novas possibilidades de se tornarem plataformas interativas, inclusivas e colaborativas. Com isso, surgiu a necessidade de compreender as abordagens adotadas e traçar modelos e processos que viabilizem novas formas de pesquisa e interação com o patrimônio cultural.*
A internet trouxe para a museologia uma nova perspectiva, porque permitiu potencializar o acesso aos museus de forma mais ampla e também por dar oportunidade aos museus de saírem de seus muros. (Teixeira, p. 224, 2021).*
Assim, a Vila Santo Antônio da Barra (atual município de Condeúba), se emancipou no final do século XIX, e no ano de “1911 passou a ter uma nova divisão administrativa composta por cinco distritos: São Filipe, São João do Alípio, Santa Rosa, Candeal e distrito sede.”
As relações de poder local e parentela permeavam as questões de controle político na cidade de Condeúba. Frente a este cenário, “a Bahia foi se desenvolvendo de acordo com interesses dos diversos “coronéis” regionais, preocupados em se manter no poder, para garantir seus próprios interesses.”* . Percebe-se que a ascensão da patente de coronel advinda da Guarda Nacional, assentou-se um sistema de controle e poder
comandado por grandes latifundiários e senhores de escravos, e que possibilitou a consagração do poder local da família dos Cordeiros da Silva na Vila de Candeal (atual município de Cordeiros).
Nesse sentido, após a proclamação da República, efervescências históricas começam a se destacar no século XX, trazendo à tona vestígios do coronelismo, mandonismo e advento do populismo que se destaca “a partir da década de 1930, ou seja, após a chamada revolução de 1930 e que determinou o fim da “política do café com leite” e, por consequência, a partir da entrada de Getúlio Vargas no poder” . *
O município de Cordeiros é emancipado pela Lei Ordinária n. 1605, de 28 de dezembro de 1961, mas só ocorrerá a primeira eleição para prefeito e vereadores em 03 de outubro de 1962, ficando a localidade sob a administração de Condeúba, até a posse dos eleitos em 07 de abril de 1963 .*

Figura 2 - Diploma de posse do prefeito de Cordeiros Joaquim Gonçalves, emitida como documento digitado em 24 de março de 1963 pela Junta Eleitoral. O documento descreve votação eleitoral ocorrida em 07 de out. de 1962 conferindo diploma que empossa Joaquim Gonçalves como prefeito. Documento original com amarelamento por ação do tempo, amassos, rasgos e alguns escritos à mão. Acervo Documental digitalizado pelo Museu Virtual Professora Noêmia Lourenço da Silva.
Nesse cenário, as relações de poder em Condeúba, ainda estavam enraizadas em decisões políticas-administrativas para o município de Cordeiros, mesmo após a posse dos eleitos por eleições majoritária e proporcional em 1963 e, refletiu na formação educacional cordeirense. O prefeito de Condeúba, Antônio Andrade dos Santos (1968-1971), em articulações com o Governo do Estado, consegue firmar parceria, a fim de que professores formados fossem alocados para o interior, especificamente a região de Condeúba e adjacências até o município de Cordeiros. *
Nesta época, a região possuía professores leigos, o termo “leigo” originário pela Igreja Católica se caracterizava o indivíduo que não possui o conhecimento do sagrado, ou seja, da fé. E também, estava ligado a falta de formação básica para lecionar. Assim, ser professor leigo significa não ter o domínio do conhecimento científico da sua área de atuação, nem o entendimento das questões pedagógicas que envolvem a prática docente.

Assim, a professora Noêmia Lourenço da Silva, nasceu em 05 de outubro de 1935, natural de família humilde da cidade de Maceió, Estado de Alagoas, onde fora criada desde sua infância por freiras em internato na capital alagoana, é alocada para atuar nos sertões da Bahia com o propósito de propiciar um cenário de desenvolvimento da educação local. *

Figura 3 – Formatura de Noêmia Lourenço da Silva. Fotógrafo desconhecido. Acervo pessoal de Cinara Alves de Moraes Andrade. Foto digitalizada pelo Museu Virtual Professora Noêmia Lourenço da Silva.
Figura 4 – Noêmia Lourenço da Silva à esquerda e seus colegas professores. Fotógrafo desconhecido. Acervo pessoal de Cinara Alves de Moraes Andrade. Foto digitalizada pelo Museu Virtual Professora Noêmia Lourenço da Silva
Noêmia Lourenço da Silva, professora formada, iniciou sua carreira educacional em Maceió, adotando uma abordagem pedagógica conservadora que incluía o ensino da tabuada, caligrafia, cultura cívica e orações em sala de aula. Sua atuação em Cordeiros, foi influenciada pelos valores do coronelismo e mandonismo, que permeavam tanto a escola quanto a família.
REFERÊNCIAS
Noêmia, teve uma atuação indireta na formação do município de Cordeiros, modificando o cenário da educação local com sua prática pedagógica. Mesmo após se aposentar, continuou a ensinar voluntariamente em uma instituição social em Ilhéus, onde faleceu em 20 de julho de 2006.* Sua trajetória educacional reflete os desdobramentos históricos da educação nos sertões da Bahia, profundamente marcados pela influência do poder local na educação.
BAHIA. Lei Ordinária Nº 1605, de 28 de dezembro de 1961. Cria o município de Cordeiros, desmembrado do de Condeúba. Bahia: Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, 1961. Disponível em: https://leisestaduais.com.br/ba/lei-ordinaria-n-1605-1961-bahia-cria-o-municipio-de-cordeiros-desmembrado-do-de-condeuba?q=1961. Acesso em: 09 jun. 2024.
CARVALHO, Joandina Maria de. Condeúba, uma importante cidade baiana na década de 1920. In: XIV Encontro Nacional de História Oral, 2018, Campinas - SP. História Oral e Registro Audiovisual, 2018. Disponível em: http://www.encontro2018.historiaoral.org.br/resources/anais/8/1525023105_ARQUIVO_Condeuba.pdf. Acesso em: 10 jun. 2024.
__________, Joandina Maria de. Poder e parentela em Condeúba: uma forma de mandonismo (1910-1950). TCC (Especialização em História Social). Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, 2000.
CHAVES, Rafael Teixeira. O Fato Museal na Virtualidade: Reinvenção a partir da Pandemia de COVID-19. 2023. 176. Dissertação. (Mestrado em Memória Social e Patrimônio Cultural). Programa de Pós-Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural, Instituto de Ciências Humanas, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2023. Disponível em: https://repositorio.ufpel.edu.br/handle/prefix/10810. Acesso em: 10 jul. 2024.
MORAES, Aquilina Alves de [78 anos]. [fev. 2020]. Entrevistador: Yan Roberto. Cordeiros, Bahia, BA, 10 jan. 2020.
SILVA, Miguel Vinícius Teixeira da; KUYUMJIAN, Andréia Leite; BARBOSA, Cybele Brahim. A educação no contexto do populismo e neopopulismo no Brasil. In: Pró-Discente: Caderno de Produções Acadêmicas-Científicas do Programa de Pós-Graduação em Educação, Vitória: Espírito Santo, v. 21, n. 2, p. 39-53, jul./dez. 2015. Disponível em: https://periodicos.ufes.br/prodiscente/article/view/13222. Acesso em: 10 jun. 2024.
TEIXEIRA, Robson da Silva. Coleção de Objetos Museológicos do Museu Virtual do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro: Virtualidade, Memória e Museu. Revista Práticas em Gestão Pública Universitária, ano 5, v. 5, n. 1, p. 218-239, 2021. Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/pgpu/article/view/41620. Acesso em: 10 jul. 2024.
Este texto foi desenvolvido com apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura via Lei Paulo Gustavo, direcionada pelo Ministério da Cultura, Governo Federal. Paulo Gustavo Bahia (PGBA) foi criada para a efetivação das ações emergenciais de apoio ao setor cultural, visando cumprir a Lei Complementar nº 195, de 8 de julho de 2022.
Nossos contatos
Memórias de Cordeiros

Menu




